Mostrar mensagens com a etiqueta de narrados. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta de narrados. Mostrar todas as mensagens

quarta-feira, agosto 8

minusculissimos






















Tinha mais dunas e nenhuma palmeira, a praia que fizeram sua.
O mar estava mesmo ali, à beira de um esticar de braços - e não experimentaram tocá-lo.
Ficaram sentados nas dunas, a encherem-se de areia, rindo dos grãos que se esgueiravam pela roupa.

Tinha mais dunas e mais vento, a praia que fizeram sua.
Recostados na inclinação arenosa, escorregando devagar, avistando-se o mar e com vista para dentro. Tapete de Atlântico, pontilhada de milhões de minúsculos grãos de areia, pequeninos, dourados, aderentes à pele, num remanso docemente rido.

Tinha mais dunas e muita areia, a praia que fizeram sua.
Muita areia, mas não como a da ampulheta ou dos grãozinhos que páram os mecanismos.
Minusculissimos grãos de areia, tão pequenos que o tempo passou sem marca, eles mesmos provindos de outras eras, guardadores de segredos e sonhos.

Tinha mais dunas e mais sonhos, a praia que fizeram sua.
Sonho de alongar o sentar, recostar, aninhar, falar e rir. De caminhar mais tempo com saltos altos nas mãos. Sonhos de parar o tempo a olhar o mar. Sonhos de olhar o mar sem tempo.

Tinha mais dunas e nenhuma palmeira, a praia que os fez mais um do outro.
E muitos, milhões infinitos, minusculissimos grãos de areia.

quinta-feira, junho 28

Flash





















Disse-me que uma tarde, olhou para si - como se fosse a primeira vez, que os olhos não levavam nada no olhar. Uma mirada crua, um relanceio despido de entendimento, de quem nada espera. Não ficou triste, não chorou. Faltava-lhe o ânimo para se apiedar.

Contou-me devagar, entre golos de uma bebida amarga, que nem revolta havia, só um desalento do tamanho da tarde. Nenhum vento se ouvia, nem fazia bater janelas. Nenhuma tempestade assolava a moradia abandonada.

Apeteceu-lhe sair e não levar chave nem mapa. Abrir a porta e deixá-la aberta. Largar o dia, e deixá-lo inerte na beira da estrada. Caminhar embalada no vento.

Faço-lhe companhia nesta tarde, não no olhar mas no abandono. Por momentos, sintonizo o meu passo com o dela, e deixo o vento embalar-nos. Atrás do rosto, dentro, em si.

(Woman face, Johfra)